Eu estava assistindo aos jogos olímpicos. Aqui do lado, mas parece que é noutro mundo, tão inacessível, o Rio de Janeiro. Na Candelária do massacre, o fogo grego no centro de uma escultura que gira e gira e gira. Hoje dois brasileiros fizeram a final da ginástica de solo. Estavam em segundo e terceiro lugar, faltavam dois atletas. Um por um, a plateia ensandecida comemorou os erros deles. Em alto e bom som. Veja bem, não no final da apresentação, o que teria sido já muito cruel, mas enquanto eles ainda se apresentavam. Que tristeza, uma tristeza funda de saber daquela crueldade de trás pra frente, de cor e salteada.
E depois os vencedores começaram a chorar de alegria, a se abraçar, abraçar os treinadores. Difícil ver alguém tão feliz e comovido e não se sentir feliz por ele. Antes eu tinha imediatamente gemido de dó do cara que errou e ficado com os olhos marejados de vergonha da torcida. Perder porque o outro foi brilhante é uma coisa, perder porque se ficou como que abaixo de si mesmo é outra. Como alguém pode comemorar uma dor dessas?
Ironicamente, a narrativa da tv e do jornalão enaltecia um dos brasileiros porque ele havia caído de bunda no chão na olimpíada anterior, quando era o favorito dessa prova. E havia sido avacalhado por isso, "nas redes sociais". Ah, ele está tão emocionado porque deu a volta por cima, superou tudo, mas sobretudo, todos.
Finalmente, descubro no jornalão que o outro ginasta-agora-heroi fez umas brincadeiras racistas com um outro, que não entrou. E que disse que eles se entenderam e está tudo resolvido, que deseja tudo de bom pro cara que comparou a pele dele a um saco de lixo. A pira gira. O giro pira. Spirogyra é spairodjaira. O Rio de Janeiro continua lindo, vanguarda da barbárie.
Quem puder, leia a crônica do Antonio Prata, "E se nossos fracassos fossem transmitidos ao vivo?" E os comentários bárbaros no page bottom.
P.s. o medalhista de ouro, britânico, comemorou discretamente, não sei se intimidado, porque é assim mesmo na terra dele ou o quê. Eis algo que eu gostaria de saber.
P.s 2: O camarada que ficou com o bronze, o mesmo das piadas racistas, bateu continência no pódio, porque recebe o apoio das forças armadas. Inclusive é oficial.
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